lana caprina

Thursday, May 04, 2006

O viver da nobreza medieval portuguesa, segundo Camilo

Veja-me esta janela, a única das três que provavelmente o paço tinha. Das três, digo, e aproveito o ensejo de inteirar o leitor da bruteza imunda da fidalguia daquelas eras. Os paços de então, tirante a belicosa torre, eram cortes de gado. Comiam à unha do mesmo sarro de cortição ou gamela, bebiam do mesmo acéter, dormiam no mesmo sobrado os de um sexo, os do outro no sobrado vizinho; e os sexos sacramentalmente misturados não sei onde pernoutavam. Quantos paços conheço por este Minho, tais como o de Numães, o de Carude, o de Barbude, o de Delães e outros menos arruinados, oferecem-me crer que os fidalgos portugueses, até ao século XIII, eram uns animalaços que não comiam nem pernoutavam mais limpa e honestamente que os nossos bácoros e os nossos mastins.

CAMILO CASTELO BRANCO, O Senhor do Paço de Ninães [1867]

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