lana caprina

Monday, March 07, 2005

Começos... (5)

O Matesinho de São Mateus era o maior gavola que a Vila da Praia tinha. Isto diziam certos pescadores, cheios de invejidade da sua fisga certeira. Por mim (escreve Mateus Queimado) nunca vi peito mais firme, dentes e riso mais abertos, bizarria maior a contar uma vida caipora, sim, mas mais divertida e rasgada que uma tarde de toiros cheia de fava torrada e de guiseiras luzidas.
Pelava-se por vinho e cachaça, entrando às vezes em casa perdidinho de bêbedo. É verdade que passava às vezes um mês e mais sem no copo; mas, em, no avezando, acabava-se o mundo! Chegava-lhe - "por alma da caixa velha"!
Embezerrava então pelos cantos das vendas e, nas manhãs de Verão, esmalmado na areia, cozia a mona ressonando e enxotando as moscas varejas. O seu fraco era a aguardente do balcão - que emborcava, sem pestanejar, aos dezasseis de cada vez. Numa aposta, mesmo, lá ia meio quartilho. Enxugava também com limpeza o seu cálix de nêspera, empinando-se, com o nó da goela a embolar debaixo da papada. De noite esquecia-se pelas lojas a porteirar e a borrichar. A pobre da mulher, então, de xale pela cabeça, lá fazia a via-sacra das vendas da Vila da Praia, espreitando agachada às vidraças.

VITORINO NEMÉSIO, "Quatro Prisões debaixo de Armas" [1949]

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